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quinta-feira, novembro 24, 2005

A invasão turca

Muito se fala da crise de valores, de identidade e de referências da sociedade portuguesa, que por sua vez está a provocar a actual crise sócio – económica. A agravante de toda esta realidade dura e crua, não é exclusiva de Portugal, e está também afectar as instituições da União Europeia, em consequência da ausência de líderes fortes no seio dos Estados-membros, em especial no eixo franco-germânico.
Seja ele considerado bom ou ruim, a dinâmica imprimida pelas duas maiores potências da Europa Continental, resultou num aprofundar sistemático das instituições comunitárias, sobretudo até ao início da década de 90.
Nessa altura singravam na cena política internacional personalidades como Jacques Delors, François Mitterand ou Helmut Kohl, havia sem dúvida alguma referências para os seus povos, que credibilizavam os seus esforços europeístas.
Hoje, isso não acontece, pois pura e simplesmente não existem individualidades idóneas que dêem confiança no que concerne à unidade europeia, muito pelo contrário, a vontade e o desejo dos povos da Europa são constantemente vetados por uns meros eurocratas, sem qualquer tino de responsabilidade no que diz respeito ao futuro concreto de todos os europeus.
É portanto discutíveis até que ponto as decisões políticas comunitárias terão o efeito pretendido, quando existe pouca confiança entre os cidadãos e os eleitos. É essa fraqueza nos alicerces da Europa que pode a médio prazo ditar a ruína da construção europeia, sobretudo com a inclusão de assuntos da primeira ordem da discussão e na implementação de acções concretas que nada fomentem o desenvolvimento dos europeus, como é o caso da adesão da Turquia!
De facto, a colocação da questão da adesão da Turquia em cima da “mesa” das preocupações da Comissão Europeia, só significa uma coisa, em especial, com os resultados negativos dos referendos na França e na Holanda, no concerne à ratificação do novo tratado da Europa – a falta de respeito pelas inquietações desses dois povos fundadores da ora União Europeia, e bem como a ausência de pudor em cumprir as promessas que foram feitas após esses dois “terramotos” políticos, ou seja, de repensar o modelo social da Europa, porém, o mais gravoso de todos esses lobbies pró – Turquia, que está mais visível nos membros que lideram as instituições e dos governos de alguns Estados-membros é de branquearem da História o genocídio turco sobre milhões arménios, a opressão sobre os Curdos, a invasão de Chipre, o militarismo que fere a liberdade e a democracia interna do povo turco é vista de ânimo leve.
Porquanto se essa vontade de fazer aderir a Turquia ao projecto europeu se mantiver por esses decisores políticos pouco escrupulosos, a caracterização verdadeiramente nobre e distinta da União, isto é, a liberdade e a democracia será vencida pela altivez falsa e de colocar uma questão insensata que é a religião no cerne deste debate.
Por outro lado, e porventura a Turquia venha aderir à União, oxalá que isso nunca venha a surgir, as fronteiras da Europa política deixam de existir, pois se esse país asiático, cuja sua capital está na Ásia Menor, então se é assim, porquê é que há-de recusar a adesão de todos os países do Norte de África, (o Magrebe) que há longos séculos, tal como a Turquia mantém vários tipos de relação com a Europa. E então, porquê não aceitar a entrada dos países do Médio Oriente, e já agora daqueles onde outrora estava situada a Mesopotâmia, para muitos foi berço do pensamento europeu.
À luz da pretensa adesão da Turquia, e segundo os mesmos critérios, era legitimo que Marrocos, a Argélia, a Líbia, a Tunísia, o Egipto, Israel, a Palestina, o Líbano, a Síria, o Iraque, Irão…e quem sabe se isto expandiria mais para leste ou para sul.
Aos olhos de um mero cidadão do mundo, a inclusão destes países na União seria impensável, mas atendendo ao factor histórico, o grande argumento dos defensores deste tipo de alargamento, tudo isto seria possível. No entanto o que diferencia estes países dos actuais 25 Estados-membros, não será o factor cultural, em grande medida influenciado pela religião, sobretudo pelo cristianismo, que de um certo modo veio a unificar o pensamento, os hábitos e os costumes dos europeus, com as suas devidas distinções regionais.
A alegação de que se quer apenas fazer da Europa, um “clube” cristão é falsa, porque em que a Albânia e a Bósnia, países de maioria muçulmana tiver condições e vontade para aderir à União, só que nesse caso existe um dilema regional de grande conflituosidade étnica e religiosa que atrasa a convivência pacifica dos povos dos Balcãs. Aí sim, urge a necessidade de resolver a intemperidade política e social que assola há mais de uma década esta terra da Europa.
Os Balcãs e a Turquia são a dicotomia da ampliação da União. Isto é, ou tenta pacificar e desenvolver uma região massacrada pelo ódio, de modo que o expansionismo europeu tenha continuidade e se cinja ao espaço territorial do velho continente, e que não entre numa tolice chamada Turquia que nos é culturalmente distante, corrompendo portanto a caracterização social e geo-politica da Europa.
Do ponto de vista politico e moral é inaceitável que um país que é apenas pretendente, não reconheça Chipre como nação soberana e independente, que é neste momento um Estado-membro de pleno direito, o que só revela a prepotência perante as instituições comunitárias, sendo encoberto por este cinismo pela Comissão Europeia que pretende com esta situação somente liberalizar e desregular as relações económicas, porque com a entrada da Turquia poderia aguçar o apetite dos grandes investidores em apostar neste país da Ásia Menor, deslocalizando várias unidades industriais, aproveitando uma mão-de-obra baratíssima e pouco qualificada, e ao mesmo tempo usufruir de um mercado com mais de 70 milhões de consumidores para escoarem parte da sua produção.
Vinco o facto de não se poder esquecer dos atentados contra os direitos humanos por parte do Estado turco, fora das suas fronteiras como foi o genocídio arménio ou a intolerância com os Curdos, e quer no plano interno, com a sistemática violação dos direitos básicos constitucionais do povo turco, que é o próprio alertar a farsa orquestrada pelo o seu próprio governo, aonde são as próprias organizações de defesa dos direitos cívicos a duvidarem da real intenção de um Estado altamente militarizado, que tenta apagar uma imagem de intolerância e de perseguição, tendo ao seu dispor uma importante ajuda de uma parte significativa dos políticos europeus, mas que não é corroborada certamente pelos povos da Europa, porque são estes a ultima hipótese da União ainda poder-se salvar de legitimidade democrática contrapondo aos seus políticos manipuláveis e dúbios.
Não se pode escamotear a verdade e a realidade!!
É evidente que a Turquia não sendo um país europeu definitivamente, tem tal como os países que marginam o Mar Mediterrâneo, um importantíssimo papel a desempenhar como um bom vizinho, aberto à cooperação bilateral a vários níveis, desenvolvendo-se socialmente de modo a irradicar os factores negativos que assolam a sua sociedade.
Contrariamente, ao que pensam os seus governantes, a influência do país que Ataruk fundou, desempenhará na Europa não será de acção política interna e directa, mas sim de acção externa, muito devido à sua situação geo-estratégica no Médio Oriente, e se tiver vontade poderá servir de catalizador de experiências, de acções e de esperança, em pacificar a sua região de afectividade, o mundo árabe, sendo portanto este o seu desígnio natural, e certamente terá maior abertura, dedicação e apoio das instituições comunitárias e dos europeus.