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segunda-feira, julho 19, 2010

Os Heróis de Malaca

Em 2011 celebra-se os 500 anos da conquista de Malaca pelos portugueses. Todavia, foi efectivamente, no ano de 1510 a data da chegada dos homens de D. Afonso de Albuquerque, àquela que era considerada a “Veneza” do sudoeste asiático, pois o seu porto era frequentemente visitado por mercadores vindos do Japão, China, Filipinas, Molucas, Pérsia, Malatar, Arábia e até de África.

A sua situação geoestratégica em relação ao comércio marítimo da Ásia, fez com que os bravos exploradores lusitanos tomassem Malaca em muito pouco tempo. É espantoso que um pequeno país, com um pequeno exército, que rondaria na época 40 000 homens, dominasse o Reino de Marrocos, as costas marítimas ocidental e oriental de África e praticamente todo o comércio marítimo vindo da Ásia.

Se na então Índia Portuguesa que caiu nas mãos da União Indiana nos anos 60 do século passado, e bem como em Macau, cuja transferência da administração passou em definitivo para a China, em 1999, nestes dois casos havia uma ligação institucional com Portugal.

O mesmo já não acontecia com Malaca, aonde esse vínculo institucional deixou de existir há séculos. Mas o que nunca findou, foi uma enorme vontade dos descendentes dos portugueses em continuar a preservar a herança histórica e cultural dos seus antepassados.

Um dos grandes dinamizadores da cultura portuguesa em Malaca é o Mestre Noel Felix, que viu realizado o sonho de uma vida, visitar Portugal. O nosso grande Mestre dizia que se sentia muito “gabado” em estar na terra dos seus “avós”.

Durante a sua estadia em Portugal, que ocorreu entre o final do mês de Outubro e o início do mês de Novembro, também eu tive a felicidade de conhecer o grande Mestre, e não resisti em fazer a seguinte pergunta: “qual era o segredo que fez com que preservassem a cultura e a língua portuguesa durante todos estes séculos apesar do abandono do Estado português?” E foi então que o nosso Mestre simplesmente respondeu: “porque sentimos orgulho em sermos portugueses!”.

Bom, tomando o exemplo dos Heróis de Malaca, que contra todas as adversidades, conseguiram manter as tradições e a língua portuguesa naquele cantinho da Ásia, o mesmo já não acontece na sua vizinha Ilha da Sumatra, pois já ninguém preserva a cultura holandesa, antiga potência colonizadora, mas há também que prestar homenagem à comunidade macaense e toda a diáspora portuguesa, que vai mantendo a herança lusitana nas terras de acolhimento, apesar do abandono das entidades oficiais.

De referir, que a Associação Coração em Malaca está a desenvolver um notável projecto chamado “Povos Cruzados” dinamizado pela Cátia Candeias, mais conhecida pela Bárbara do Bairro Português e pelo José Machado, mestre em danças de folclore.

 Um dos objectivos principais deste trabalho será em preparar um manual com um dicionário de palavras em português e português de Malaca. O manual será escrito em quatro línguas: português – português de Malaca – malaio e inglês para quem dele deseje recorrer e necessitar de aprender a falar e escrever. De referir que em toda a Malásia existem à volta de 200 palavras de origem portuguesa.
Os esforços da comunidade de origem portuguesa em Malaca, que hoje ronda as 1200 pessoas não pode cair no esquecimento, pois o seu trabalho diplomático é grandioso. As autoridades malaias permitem que esta comunidade goze de alguma autonomia e tenha órgãos políticos próprios, como é o caso do Painel do Regedor.
Decalcando as palavras do último presidente do Leal Senado de Macau, José de Sales Marques, quem quiser ser um empresa internacional e se esqueça da Ásia, não sabe o que anda a fazer, já para não falar que o sudoeste asiático possui uma população de mais 600 milhões de pessoas, e o seu crescimento económico galopante deveria ser considerado um grande incentivo por parte do Estado e das empresas portuguesas, para ali apostarem forte na sua internacionalização.

Por outro lado, há que observar com atenção a história e ter em conta que o eixo Goa-Malaca-Macau tem praticamente metade da população mundial, e com os antepassados históricos que Portugal tem com a região, urge a necessidade de retomar essa rota. Na rota do empreendorismo, pois Aicep deveria focalizar e adequar a sua política de incentivos para essa emergente área de negócios e não só para os mercados mais óbvios que são actualmente Angola e o Brasil, há que diversificar o investimento externo.

Mas uma melhor definição estratégica do investimento externo não chega, talvez precisamos de uma acção diplomática mais activa no campo económico e cultural, e aí os Heróis de Malaca tiveram e têm uma relevância extrema.

Por fim, não podemos esquecer que o Estado português deve proporcionar às suas comunidades espalhadas pelo Mundo, como é o caso da comunidade Macau e de Malaca, uma estreita ligação a Portugal, no entanto não se tem verificado um grande empenho por parte dos nossos governos em preservar esta relação histórica.

 A inexistência de voos da TAP para estas regiões também é sintomático de uma falta de interesse em investir nestas importantes áreas do globo. Se oficialmente a administração da TAP diz que economicamente não é viável, em termos do interesse nacional esses voos para a Ásia são imprescindíveis para que o orgulho de ser português e o fomento dos negócios com a Ásia possam florescer, pois se tal aconteceu no passado, também com algum empenho poderá acontecer no presente.

Artigo publicado na revista Raia Diplomática em 28.11.2009

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