Número total de visualizações de páginas

domingo, agosto 27, 2006

Líbano e Israel – Entre a Paz e a Guerra


Como se previa as tréguas entre o Exército Israelita e o Hezbollah são muito ténues, e a própria Resolução 1701 veio a reforçar esse espírito inquietante. Contudo é muito melhor uma situação de instabilidade e de algum jogo de terror psicológico do que a realidade nua e crua da guerra, dos bombardeamentos, do sofrimento e da morte.
Se a aprovação da Resolução 1701 foi feita sob a pressão, de um lado dos Estados Unidos que demarcou bem a posição de Israel, exigindo algumas clausulas neste documento que põem no terreno a paz muito débil, por outro lado a opinião pública internacional que ficou horrorizada pelo ímpeto bélico, sobretudo da aviação israelita aos alvos civis, sejam eles urbanos ou nos meios rurais.
Alias, Israel perdeu a guerra de facto, pela sua mediatização nos meios de comunicação social e pelos seus sucessivos erros táctico-militares que minaram por completo a credibilidade do governo de Telavive neste conflito.
Ao contrário de outros confrontos militares mais ou menos recentes, aonde a sua exposição pública, aquilo que os “mass media” transmitiam era apenas a parte que um dos beligerantes queria que transparecesse para o exterior. Recorde-se da guerra na antiga Jugoslávia, em que os separatistas eslovenos, o HDZ de Tudjman e o DAS de Izetbegovic rodearam-se de poderosas agências americanas de marketing e imagem que criavam ficção em realidade para além da criatividade dos seus profissionais para o transformismo das imagens televisivas e dos relatos mais ou menos incoerentes, possuíam fortes influências junto dos políticos americanos e europeus para dar seriedade ao seu trabalho, que na sua maioria era falsa e que por roçava o sarcasmo.
Mas esta ficção não tem grandes semelhanças com o conflito a que estamos a presenciar, Israel cometeu demasiados erros estratégicos que os “katiuskas” do Hezbollah podiam ser considerados como actos de legitima defesa, ou melhor, de vingança ao massacre perpetuado pelo exército israelita à indefesa população libanesa. Era a inversão da lenda de David e Golias, sendo Israel neste contexto o imponente gigante que queria destruir o pequeno David (Líbano).
Todavia Israel ainda não se apercebeu donde veio a sua derrota, e viola grosseiramente, e com alguma frequência o cessar-fogo, atacando bairros xiitas de Beirute, alegadamente devido a movimentações militares do seu rival.
Tais acontecimentos obrigaram o governo do Líbano, até então o mais neutral em relação ao medir de forças entre uma facção do seu próprio governo, o Hezbollah, pois não esqueçamos que este partido político e milícia armada é o grande orientador espiritual e económico de mais 1/3 da população do país do cedro, a condenar vivamente mais uma prepotência israelita, e inclusive a ameaçá-la de intervir também no terreno das operações.
Já a ameaça calculada e política ao Hezbollah para que esse não atrevesse a lançar ataques ao norte de Israel a partir do Líbano, que também seria um dos alvos do exército regular libanês, vem colocar o governo de Sionora numa posição moralmente elevada, isto é, patrioticamente iria ripostar aos ataques do Tsahal, e por outro lado, avisando o Hezbollah que apesar não poder desarmá-lo, conforme diz a nova resolução das Nações Unidas, vem assim anunciar ao seu povo que quer manter a paz, custe o que custar.
Sionora faz assim a primeira jogada táctica de relevo em relação aos seus colegas xiitas da sua coligação, estando agora lado a lado na simpatia do povo do Líbano em relação a Hassan Nasrallah.
Mas tudo isto poderia ser evitado se houvesse uma maior celeridade no processo de formação da nova UNIFIL.
Todas estas peripécias da doação dos efectivos das forças da ONU, mostra bem o sentido oportunista e da falta de crença dos países ocidentais em consolidar a paz no terreno – franceses, britânicos e americanos têm todos culpas no que está a suceder, e em verdade, todos eles têm uma grande cota de culpabilidade no desencadear e no desenvolvimento desta guerra.
Teorizado no papel o desarmamento do Hezbollah, e como correu a sua actuação militar, o governo libanês e o seu exército, não tem capacidade para efectivar e para cumprir essa exigência. E a ser cumprida essa deliberação, neste preciso momento teria consequências devastadoras para o Líbano, com uma guerra civil com contornos imprevisíveis, pois os ganhos de popularidade que os “guerrilheiros de deus” gracejaram do povo muçulmano em geral, fazia retalhar o Líbano em duas partes quase simétricas, o que era simplesmente catastrófico.
É urgente trabalhar no desarmamento do Hezbollah a médio prazo, em primeiro lugar, para acabar com um Estado dentro do Estado multi-étnico do Líbano, de modo que a democracia floresça de vez, nesse cantinho que outrora foi a antiga Fenícia, para que cesse esta situação de bloqueio ao desenvolvimento de um Estado livre. E também, satisfazer as exigências de segurança de Israel que por sua vez não está isento neste processo.
É muito curioso que nos primeiros dias de cessar fogo, muito vigiados pela “sociedade” mundial, e apesar das pequenas escaramuças, até estava a ser respeitado, para depois descambar numa atroz violação da paz.
É claro que quando os políticos querem que as coisas aconteçam, tudo se esforçam para obter o sucesso desejado, mesmo com os contragimentos que isso possa acarretar.
Obviamente, houve uma mudança repentina do governo de Israel quanto às tréguas, estando agora a experimentar, o sentimento de reacção no seu inimigo xiita, para reacender o “rastilho” da guerra.
Todavia, se o seu antagonista não ripostar e aguentar firme na preservação da paz, Israel fica cada vez mais embaraçado com a atitude que teve para com as populações indefesas.
O governo de Olmert e Peretz que ainda estão a fazer contas aos danos provocados pela guerra, mormente os psicológicos, não pode ensaiar arrufos de destruição e a cometer barbáries quando o tempo agora é de reflexão, especialmente quando o território que atacou por várias semanas está a começar a levantar-se das cinzas, e era positivo que humanamente compreendesse o drama de milhares de pessoas que ficaram sem nada e das centenas de milhar de deslocados que regressam agora a um cenário de horror.

Sem comentários: