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domingo, fevereiro 20, 2011

PRAGA - A JÓIA DA EUROPA DE LESTE



Onde a fusão de uma antiga história com uma efervescente vida cultural vivem de mãos dadas.

Estaria interessado em visitar uma cidade, com uma longa história, com mais de mil anos? Uma cidade, onde vai encontrar monumentos arquitectónicos, desde a arquitectura romanesca do século X, e onde estão presentes os estilos gótico, renascença, barroco, rococó, classicismo, neoclassicismo até ao final do século XX. Se não é um grande apreciador de história, estaria então, interessado num outro tipo de entretenimento? Gostaria de ir às compras, passear, divertir-se à noite ou até mesmo fazer um calmo passeio de barco rio abaixo? Seja o que for, irá ter garantidamente uma fabulosa experiência.

Praga é a capital e a maior cidade da República Checa. É frequentemente chamada de Cidade de Ouro, venha visitar e veja com os seus próprios olhos uma jóia da Europa de Leste.

O centro histórico de Praga pertence a uma das mais valiosas reservas históricas em todo o mundo. Os 866 hectares do núcleo histórico desta capital foram registados na lista da UNESCO- Património Cultural e Natural.

A parte de Praga que convidamos a não deixar de visitar é o Castelo de Praga, uma vez que é um dos pontos turísticos mais visitados desta cidade, bem como em toda a República Checa. Situa-se na colina da margem oeste do rio Moldava. Construído no século IX, e ainda nos dias de hoje, apresenta-se como o maior Castelo em todo o mundo, com 570 metros de comprimento e 128 de largura. A área do Castelo é de 7,28 hectares, sendo que o presente complexo é uma mistura de estilos.

O Castelo de Praga foi na maior parte da sua história, a sede oficial e residência de reis, príncipes e governadores checos. A partir de 1918 tornou-se a sede do Presidente checo, assim como a sua residência oficial.

A área a oeste do Castelo de Praga é chamada Hradcany e no seu centro encontra-se a Praça Hradcany. Esta área, em tempos, foi uma cidade independente, com os seus direitos reconhecidos no século XIV. No final do século XVI tornou-se um dos bairros de Praga. Cobre uma área relativamente pequena desde o portão de Praga até ao Mosteiro de Strahov. O castelo de Praga tem três pátios e um complexo de edifícios. Na parte central do Castelo, encontra-se a magnificente Catedral de S. Vito. As fundações de pedra da Catedral foram colocadas em 1344 pelo Imperador Carlos IV. Foi acabada tardiamente no ano de 1929. Nesta Catedral estão armazenadas jóias da coroa e é onde também estão enterrados antigos reis checos. A Catedral de S. Vito tem duas partes: a Gótica, situada a leste, com a torre principal, construída nos séculos XIV e XV e a Neo-Gótica, situada a ocidente com duas flechas, construída no século XIX e ao virar do Século XX.

Desde a Revolução de Veludo de 1989, Praga tornou-se mais visitada. Existem muitas razões para as pessoas de todas as idades se deslocarem a esta cidade. Algumas delas têm interesse pela sua história antiga, que vai para além de mil anos, e outras pessoas visitam Praga pelo prazer cultural que vão ter, tal como, teatro, ópera, ballet. Para as pessoas mais jovens existem vários espectáculos realizados pelos mais variados artistas.

Para a sua estadia em Praga, sugerimos o Hotel Clarion Congress. Desfrute de um ambiente moderno e de um design elegante. Disponha de um sofisticado equipamento tecnológico. O requintado serviço deste hotel irá certamente satisfazer as expectativas do mais exigente cliente.

Muitos jovens encontram em Praga um ponto de diversão à noite. A vida nocturna desta capital é conhecida pela constante visita de lendas da música e actores famosos. Existem muitas discotecas e bares, mas aqui recomendamos apenas alguns lugares: o Club Mecca, Karlovy Lazne, Dulplex, N11, Stonx, Zlaty strom Bar e Discoteca, Roxy Dame. A promessa de divertimento é garantida com a companhia de pessoas de todo o mundo.

Com preços razoáveis, e um alto padrão de qualidade, destacamos os seguintes restaurantes: Club Mecca, Kampa Park, Radost FX´s (comida vegetariana).

Para as suas compras, sugerimos o Centro Comercial OD Kotva, com a oferta de uma perfeita mistura de todas as últimas tendências da moda, com as suas lojas e boutiques. Tire partido dos serviços e das muitas oportunidades para diversão e entretenimento.

Este texto foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

sábado, fevereiro 19, 2011

CARNAVAL EM CHAMAS - O ESPECTÁCULO NÃO PODE PARAR



Na manhã do dia 7 de fevereiro, uma parte dos sonhos dos foliões do Rio de Janeiro foi consumida pelas chamas.

Segundo o corpo de bombeiros por volta das 7: 15 da manhã, na zona Portuária do Rio de Janeiro onde ficam os barracões das escolas de samba, quatro barracões, foram atingidos pelo fogo, entre as escolas afectadas estão grandes nomes como Grande Rio, Portela e União da Ilha.

Até o momento ainda não saiu o resultado do laudo técnico sobre a motivação do incêndio, mas descarta-se a possibilidade de ter sido um acto criminoso, questionou-se também o tempo levado para controlar as chamas. O corpo de bombeiros justifica-se que devido ao grande número de material inflamável, houve maior dificuldade na acção.

Felizmente não houve vítimas mortais apenas um homem na faixa dos 30 anos que no interior do prédio, consegui escapar por uma janela, inalou bastante fumo, mas saiu consciente do local e ficou em observação sem maiores gravidades.

Foram necessários 120 homens do corpo de bombeiros de sete quartéis para realizarem o trabalho de rescaldo. Trinta e nove viaturas da corporação deram suporte à acção.

Uma gigantesca nuvem negra cobriu toda a zona portuária do Rio e podia ser avistada ao longe.

O fogo alastrou-se rapidamente devido a todo material altamente inflamável, esculturas e fantasias, como papelões, papéis e madeiras e material plástico.

Os dirigentes da Liga das Escolas de Samba (LIESA) abalados declararam que é investido cerca de R$ 7 milhões para cada escola passar pela avenida. A maior parte desses recursos é investida em carros alegóricos, esculturas e fantasias.

Observando rostos desolados dos organizadores e seus membros, fica claro que a maior perda é ver um ano todo de trabalho, esperança e muito suor, executados por centenas de homens, serem consumidos em poucos minutos a tão pouco tempo para o dia dos desfiles.

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, assegurou que a prefeitura ajudará às associações a preparar todo o material para permitir que possam participar normalmente dos desfiles.

Segundo o LIESA(liga das escolas de samba) junto a Prefeitura decidiram que as três agremiações prejudicadas pelo incêndio na Cidade do Samba, não serão avaliadas pelos juízes. Foi decidido também que nenhuma escola será rebaixada no Carnaval 2011.

O espectáculo das escolas da cidade de São Paulo vem crescendo a cada ano, dará início aos festejos entre os dias 4, 5 e 6 de março. A programação do Rio de Janeiro vai de 06 a 07 de Março, além do carnaval de Blocos de Rua da cidade de Salvador - Bahia, e tantos outros espalhados por esse imenso Brasil.

O ponto alto da festa carioca é a inclusão dos portadores de deficiência visual, que poderão ouvir a narração dos desfiles das escolas de samba do Grupo Especial, no carnaval deste ano, na Sapucaí. Segundo a Secretaria municipal de Turismo, o serviço de áudio descrição será gratuito e estará disponível no sector 13 do Sambódromo.

Segundo a Riotur os deficientes visuais poderão retirar os seus auriculares de ouvidos nas cabines da prefeitura que estarão posicionadas na entrada do sector, cuja parte é destinada às pessoas com algum tipo de deficiência.

No decorrer do desfile, uma pessoa vai narrar ao vivo toda a passagem da escola, contando os detalhes de cada alegoria, das alas e dos enredos. O sistema estará disponível no domingo, na segunda-feira e no desfile das Campeãs, serão distribuídos 60 aparelhos por dia.

O carnaval carioca continuará sendo um dos maiores espectáculos da terra. O brasileiro extrai da adversidade a sua força para recomeçar.

Momento de recolher as cinzas, arregaçar as mangas, porque os olhos do mundo todo se voltam à cultura de um povo humilde, mas com a beleza e alegria estampadas no rosto.

Luciana Port-aux, Jornalista

UNIÃO EUROPEIA - PARA QUÊ?



Agora que o chamado Tratado Reformador foi ratificado por todos os países da União Europeia, talvez seja bom interrogarmo-nos sobre algo em que, afinal, nunca pensamos, ou seja, para que serve a União Europeia. A CEE, no passado contribuiu significativamente para a paz na Europa. E agora a União?

Excluindo as posições eurocépticas radicais, que no fundo defendem que a União não serve para nada, as duas principais concepções que hoje se confrontam divergem fortemente sobre o papel da União. A concepção que chamo de autonomista – e que pessoalmente partilho - considera que, na actualidade, a União deve existir para ajudar os estados membros e os respectivos povos a exercerem o seu auto-governo num mundo cada vez mais globalizado.

A outra concepção, a federalista defende que a União se deve substituir aos estados membros em tudo o que é importante, avançando no sentido de se tornar num estado federal.

A distinção entre as duas posições pode ver-se em muitos domínios, mas um dos certamente mais significativos é o da moeda. Do ponto de vista económico nenhum sentido fazia a instituição de uma moeda única europeia (que afinal não é única) em economias tão diferenciadas e em estádios de desenvolvimento tão diversos.

Uma posição autonomista considerava muito mais sensato criar uma moeda europeia, mas sem eliminar as moedas nacionais, que poderiam ser ancoradas nessa moeda europeia, assim ajudando os estados a prosseguirem as respectivas políticas monetárias. A posição federalista, que tem prevalecido desde o Tratado de Maastricht, como todas as posições utópicas, faz tábua rasa da racionalidade económica e com o seu afã em ver a União substituir os estados nas suas funções foi a responsável por este projecto do euro, cujo sucesso é cada vez mais incerto.

É verdade que os povos europeus, a julgar pelos referendos efectivados (e principalmente pelo temor dos governos em realizar novos referendos) são cada vez menos federalistas, se é que alguma vez o foram.

Mas o federalismo é servido por uma máquina de propaganda muito poderosa com sede na Comissão Europeia - e daí o ascendente que ganhou desde Maastricht. Ascendente, ao que parece, felizmente sustido e talvez mesmo revertido com o chumbo do Tratado Constitucional.

João Ferreira do Amaral, Professor Catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG)
 
Este artigo de opinião foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

EUROPA E A POLÍTICA EXTERNA

A instituição da Política Externa e de Segurança Comum, pelo Tratado de Maastricht, como um dos domínios fundamentais da União Europeia (UE) significou um grande passo no projecto europeu ao atribuir-lhe uma dimensão além da económica – a política. Contudo, actualmente, algumas das maiores críticas feitas à UE devem-se à fragilidade do seu papel como actor na cena mundial, consequência da falta de uma efectiva capacidade militar.

Em entrevista à Raia Diplomática, Paulo Sande, chefe do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal, afirma que será difícil os 27 Estados-membros terem uma voz uníssona enquanto cada país não estiver disposto a abdicar dos seus interesses estratégicos em favor dos da União. Por outro lado, acrescenta Sande, o poder da diplomacia em questões como o combate ao terrorismo ou manutenção da paz e a disseminação dos Direitos Humanos é assumido por todos como uma prioridade do projecto europeu.

A UE é hoje o maior bloco económico do mundo, no entanto esta posição não se coaduna com a manifesta incapacidade de os 27 Estados-Membros influenciarem, conjuntamente, as relações internacionais. Quando é que haverá uma Política Externa Comum?

Haverá uma Política Externa Comum no dia em que todos os Estados-membros da UE abdicarem da sua própria Política Externa, que é uma área de reserva de soberania, e decidirem que querem ter uma voz unívoca. Em termos de Política Externa, a Europa tem desenvolvido um soft power, que é a capacidade de impor normas, padrões e comportamentos. E isto tem funcionado.
Actualmente, não existe uma vontade política de a UE se apresentar enquanto actor nas questões de segurança e defesa, mas há vontade de ser um actor em matérias relacionadas com os Direitos Humanos, procurando impedir, prevenir e gerir conflitos de natureza humanitária.

Provavelmente, o mais difícil será intervir nas questões da guerra e da paz. Acha que a defesa dos Direitos Humanos acaba por ser um terreno mais facilitado?

Eu talvez separasse bem as duas coisas. Uma coisa é a diplomacia, a Europa ser interventiva em questões de Direitos Humanos, outra as questões relacionadas com guerra e a paz, a Europa ter músculo militar na área da segurança e defesa que lhe permita sustentar as suas posições. E acrescento: a Europa não quer tomar uma posição quando se trata de Política Externa.

A Europa não quer porque não consegue ou nunca vai querer?

Não quer porque a Política Externa é o domínio talvez mais importante da soberania dos Estados. No fundo, é ir tão longe quanto possível em termos colectivos mas sem pôr em causa as soberanias. O Iraque é um exemplo paradigmático. Quando há interesses superiores, de estratégia nacional, o ir tão longe quanto possível é não ir muito longe porque os países ainda querem ter a última palavra.
A mesma situação está a acontecer no Kosovo.
E vai continuar a acontecer. Se é para sempre não sabemos. Mas é importante dizer que está a crescer de uma forma segura o modelo de intervenção da UE em matéria de defesa e de segurança e, por vezes, este crescimento é desprezado. A Europa tem, desde 2001, uma dimensão insuspeitada na defesa e nos últimos oito anos já teve 23 acções armadas, a última na Somália contra a pirataria. Com todas as críticas e todo o cepticismo, a verdade é que a Europa continua a progredir sendo que, na minha perspectiva, esse progresso deve ser feito onde ela é útil.

Em relação aos Estados Unidos, a Europa está a perder influência para países emergentes que apresentam uma maior rapidez de resposta quando se trata de tomar uma posição em conflitos internacionais?

Sabendo todos os defeitos que a Europa tem e a dimensão que os países emergentes estão a ganhar, também sabemos que o maior mercado do mundo continua a ser o Europeu e que a Europa e os Estados Unidos são uma realidade unívoca do ponto de vista do conceito em relação a muitos valores. Quando a Europa faz intervenções concretas na cena internacional, como no Líbano, no Congo ou na Bósnia, fá-lo na perspectiva dos seus valores. E quem mais faz isso no mundo? Muito poucos países para além dos Estados Unidos e da Europa. Por exemplo, para entrarem em certas regiões do mundo, sem ser da maneira como entraram no Iraque, os Estados Unidos terão sempre de passar pela Europa, quer porque tem mais sensibilidade para essas realidades quer pela relação histórica com alguns países. Aí, a Europa é um aliado.

 
A administração de Barack Obama vem facilitar essa relação?

Esta administração parece ser claramente um factor facilitador e de encorajamento aos líderes europeus. Ainda que, por vezes, a Europa padeça do problema de não ter uma Política Externa, muitas vezes não é capaz de ter uma resposta eficaz e unívoca às preocupações dos americanos.
A Europa não responde porque não tem capacidade para responder. E não tem capacidade para responder porque não tem os instrumentos, as estruturas e os processos que o permitam. Para ter todos estes instrumentos é preciso criá-los, mas para os criar é preciso ter vontade e isso não há.
Nós não nos podemos esquecer que o orçamento da UE apresenta um valor máximo de 1,27 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) dos 27 Estados-Membros e, desse valor, o orçamento aprovado anualmente pouco ultrapassa o valor de 1 por cento. Isto quer dizer que para todas as políticas, incluindo fundos estruturais, agricultura, defesa, etc., os 27 gastam menos de 1 por cento do PIB dos Estados-Membros da UE e com um valor desses é impossível que a Europa possa ter uma efectiva capacidade militar. Se o queremos fazer temos de criar, por exemplo, um orçamento de 10 por cento do PIB e dedicar metade à defesa.

Entrevista de Paulo Sande, Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal, publicada na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

PILHAS DE COMBUSTÍVEL


Encontrar fontes de energia alternativas torna-se fundamental na realidade mundial. Ambiente, poluição, efeito de estufa e qualidade atmosférica são temas que já fazem parte do discurso das entidades nacionais e internacionais em matéria ambiental, no entanto é preciso agir e delinear estratégias para uma alteração significativa nas mentalidades, nas políticas e nas instituições que mais directamente estão ligadas a este problema elevado à escala mundial.

O aumento do dióxido de carbono na atmosfera é um dos maiores responsáveis pelo efeito de estufa num mundo onde as reservas mundiais de petróleo estão rapidamente a ser consumidas e onde a queima de combustíveis fósseis está a levar ao aumento da quantidade de dióxido de carbono concentrado na atmosfera.

O uso de pilhas de combustível pode ser uma opção para a redução do consumo de combustíveis fósseis e da poluição. Mas afinal o que é uma pilha de combustível?

A um conjunto de células de combustível unidas entre si dá-se o nome de combustível onde cada uma delas é um dispositivio electroquímico no qual a energia química armazenada no combustível, na presença de um oxidante, normalmente oxigénio, é convertida em electricidade e calor.

O princípio de funcionamento das pilhas de combustível é semelhante ao das baterias, com a diferença que as células de combustível são continuamente alimentadas.

Há vários tipos de pilhas de combustível, consoante o electrólito e restante material de construção, funcionando umas a baixa e outras a alta temperatura. De entre os vários tipos, as “Polymer Electrolyte Membrane Fuel Cells” (PEMFC ou PEM) e as “Solid-Oxide Fuel Cells” (SOFC)

As PEM são alimentadas com hidrogénio puro e funcionam a baixa temperatura (cerca 80ºC), sendo indicadas para uso no sector automóvel, em que existem veículos quer de uso pessoal, disponibilizados por Mercedes, Hyunday, Toyota, General Motors, híbridos da Audi e Ford e as scooter da Honda, quer de transporte público, como é o caso de alguns autocarros a circular na cidade de Londres.

Estas pilhas de combustível podem ainda ser usadas em sistemas de produção de electricidade a nível doméstico ou pequena escala. Outro exemplo é o uso em computadores portáteis e telemóveis, em que um tipo de PEM que usa metanol em vez de hidrogénio, substitui as baterias.

As SOFC são mais flexíveis em termos de combustível, pois para além de hidrogénio são ainda compatíveis com metano e monóxido e dióxido de carbono, funcionando a elevada temperatura (700ºC – 1000ºC). Devido a esta flexibilidade, e à elevada eficiência, as SOFC são mais indicadas para produção de energia em fontes estacionárias.

Devido à geração de calor de elevada qualidade, derivada das elevadas temperaturas de funcionamento, podem ainda ser usadas em aplicações combinadas, como é o exemplo da Rolls-Royce que desenvolveu um sistema híbrido de produção de energia de 1MW, em que 800 kW são provenientes de um sistema de pilhas de combustível, que funcionam a cerca de 800ºC, e os restantes 200 kW provêm de uma turbina a gás.

Apesar das inúmeras vantagens das pilhas de combustível, como a elevada eficiencia (cerca 80%), diversidade da gama de aplicações, baixas emissões locais, amigas do ambiente (sem produção de óxidos de azoto e de enxofre), flexíveis na utilização de diferentes combustíveis e no tamanho, há também algumas limitações, consideradas como algumas barreiras à sua implementação, como o custo de materiais e de construção e a sua durabilidade.

Elsa Agante, Engenheira do Ambiente e Energia

Este artigo de opinião foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

ÁFRICA DO SUL 2010: A PAZ COM A HISTÓRIA

A África do Sul recebe pela primeira vez o campeonato do mundo da Federação Internacional de Futebol, mas as consequências sociais do evento desportivo estão ainda por determinar.

O país sul-africano lutou durante anos contra o apartheid e a comunidade internacional considera o mundial de futebol de 2010 como um ponto de aproximação cultural e um momento crucial para fazer as pazes com a história.

Na realidade, a África do Sul continua a ser um dos países em desenvolvimento no continente africano, com uma economia resistente à contracção mundial, mas com uma crise social onde subsistem focos de necessidades sociais, a propagação de doenças como o vírus da SIDA e as diferenças étnicas.

No momento em que se aproxima a realização de um dos mais mediáticos e importantes eventos desportivos do ano, o país continua marcado pela existência de alguma instabilidade social – também reflectida nas constantes greves dos trabalhadores que ameaçam a finalização das obras nos estádios dentro do prazo, ou dos taxistas que condicionam o trânsito nas principais cidades.

Durante cerca de um mês, os sul-africanos têm a oportunidade única de receber trinta e duas das mais importantes selecções de futebol do mundo, trazendo consigo adeptos fervorosos que ajudarão ao despertar da economia, seja através do impulso que trazem ao turismo, seja pela criação de postos de trabalho.

De algum modo, são os postos de trabalho associados ao mundial que ‘mais tinta fazem correr’ e que maiores potencialidades apresentam para a população local – desde a construção das infra-estruturas necessárias à realização do evento, à recepção das equipas e dos adeptos, passando pela segurança, o número de potenciais empregos directos associados ao mundial.

Mas as mudanças que a organização do mundial traz ao país vão além da simples criação de postos de trabalho.

Receber o campeonato da Federação Internacional de Futebol (FIFA) permitiu a criação de uma rede de transportes públicos nunca antes esperada neste país.

A África do Sul não possuía a mais básica rede de transportes, mas com o acolhimento do mundial veio a necessidade de criar um sistema que sustenta não só a deslocação dos 450 mil visitantes esperados, além da população local, independentemente da cor, etnia ou raça.

A nova rede de transportes e de novos postos de trabalho permitem à África do Sul tornar-se num potencial destino turístico, não só para o mundial, mas também para o futuro, ao dotar o país de serviços base neste sector da economia.

Depois de anos de segregação social, a África do Sul aboliu a política do apartheid no final do século XX, dando possibilidade a uma aproximação das diferentes etnias e raças que vivem naquele país e, que estiveram na origem de um dos mais conhecidos movimentos de defesa pela igualdade de direitos entre as raças.

Agora em pleno século XXI perspectiva-se a possibilidade única de aproximar os povos daquele país e, simultaneamente, provar ao mundo que as etnias vivem em plena harmonia e num claro processo de desenvolvimento de relações.

A África do Sul, no passado, viveu quase 50 anos dividida sob a égide de uma política de segregação social que, nas sociedades contemporâneas, não tem lugar.

A organização do campeonato do mundo de futebol da FIFA 2010, na África do Sul, apresenta-se como um potencial para o desenvolvimento das infra-estruturas locais, um impulso à economia local e uma oportunidade de aproximação de um povo.

Este texto foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

DESAFIOS IBERO-AMERICANOS


Este ano, Portugal teve a excelente ideia de propor que os Governos discutam o tema da inovação. A inovação e o conhecimento. Dois assuntos centrais que vão marcar o espírito desta Cimeira do Estoril.

Se algo sabemos com certeza é que o mundo que vem aí não será como desejamos. Tudo será distinto: a sociedade, a economia, as relações internacionais.

Não digo que se vão produzir mudanças dramáticas que se sucederam nos anos trinta. Está em marcha um novo modelo económico, relacionado em primeiro lugar, com a consolidação das economias emergentes.

 Hoje em dia, nenhum país do mundo, por mais forte que seja pode por si só resolver os fortes desequilíbrios internacionais ou regular as finanças internacionais.

Os países desenvolvidos têm que partilhar hoje à mesa com os novos estados emergentes: China, índia, Brasil, México, Rússia. Isso significa que o poder económico mundial vai ser muito mais partilhado como nunca antes.

Penso também que tenhamos de ter uma maior presença de políticas públicas. Se é assim, devemos dotar-nos de um melhor Estado, porque o que temos, estou falando da nossa região, não resulta suficiente para atender às solicitações de mais peso na condução da economia.

A transformação da arquitectura financeira faz-se quando as coisas estão realmente a quente. Uma vez que se vão solucionando, muito dificilmente resulta que exista vontade política de levar em diante uma reforma.

Desta vez o barco partiu na reunião do G-20 em Washington, embora tenho algumas dúvidas que o clima de mudança que prevaleceu a esse encontro, e de seguida em Londres, se mantenha em frente.

Dá-me a impressão que se tenha esfriado um pouco. Pode ser uma sensação térmica, mas tenho a experiência de que, quando as novas condições económicas melhoram, a vontade de mudar debilita-se. Espero que isto não ocorra.

O mundo deve avançar para uma ordem internacional que reconheça o peso relativo dos países emergentes em construção económica, com novos sistemas reguladores e, certamente, novos sistemas de supervisão, e com o fortalecimento do Fundo Monetário Internacional.

Não há outra alternativa que outorgar ao Fundo o papel de grande banqueiro central do mundo. Além disso, há que reforçar os Bancos de Desenvolvimento e, neste sentido, se temos feito tanto por resgatar a banca privada, devemos dotar os Bancos de Desenvolvimento (estou a pensar no BID e no Banco Mundial) de recursos para ajudar os países a sair da crise, sobretudo, a competir nos mercados internacionais.

Teremos que ver como montar o novo multilateralismo. O G-20 converteu-se numa realidade dinâmica, mas há que dar alguma forma de capacidade a outros países para que se sintam participantes num mundo que a todos pertence.

É um assunto complexo. Ninguém pode ignorar a importância que um grupo de países que representa 85% da comunidade mundial esteja a funcionar como está, mas há que procurar alguma maneira de envolver a totalidade dos Estados, e aí entram algumas iniciativas que estão em marcha.

A primeira inovação vai por este caminho: o da construção dos processos económicos internacionais. A segunda refere-se aos modelos de desenvolvimento. Se olharmos para trás, no que repousou o modelo na América Latina? Sobre matérias-primas baratas e mão-de-obra barata. Isso deu lugar a um crescimento económico, mas não de alta qualidade; o crescimento de alta qualidade produz-se se formos capazes de acrescentar às matérias-primas abundantes e à abundante mão-de-obra uma maior qualificação do trabalho para poder oferecer uma maior competitividade, melhor inserção nas redes internacionais de valor, melhores salários e melhores níveis de vida.

 Aqui nasce a necessidade de inovar. Inovar em um sentido - e a Cimeira Ibero-americana assim o entende – que se vá mais além da introdução de elementos técnicos; inovar no sentido de efectuar mudanças de procedimentos, de estruturas empresariais, de modelos de organização, de formas de abordar o comércio internacional.

Enfim, um conceito global de inovação, que inclua inovar no sistema da gestão pública. Há que introduzir novos critérios para a atribuição de recursos em matéria de saúde e de educação.

A inovação entendida como uma mudança, apoiada no conhecimento, na maneira de fazer as coisas. Por isso a Cimeira trata da inovação e conhecimento.

Para levar adiante este esquema, há que tecer uma aliança entre os grandes actores: o Estado, empresas privadas e nos âmbitos académicos.

A dita trilogia é que vai dar respostas aos desafios, e sobre este princípio assentam os trabalhos de preparação da nossa Cimeira, que tem lugar uns dias antes da reunião mundial em Copenhaga, sobre as mudanças climáticas.

Em último ponto, neste contexto, quero referir-me à Ibero-américa, como região e como comunidade.

Hoje mais acredito que a América Latina tem à sua frente uma grande oportunidade de levar adiante uma mudança profunda e conseguir um papel relevante no panorama internacional.

Enrique V. Iglesias é o Secretário-Geral Ibero-Americano

Este artigo de opinião foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

A MULHER NO AFEGANISTÃO VERSUS EDUCAÇÃO



Sukaina, uma jovem mulher oriunda de Kabul, relata através da sua experiência, os diferentes papéis que a mulher afegã tem desempenhado numa sociedade repleta de atribulações, desde os tempos em que as mulheres tinham acesso à educação até ao momento em que os seus direitos mais básicos lhes foram negados.

Pertence a uma família, em que a prática do Islão não era vista como necessária, as mulheres não se cobriam e nem eram penalizadas por isso porque na capital do Afeganistão, nessa altura, vivia-se sob a influência do comunismo, onde imperava a liberdade. Parcialmente criada em Londres, cidade onde se encontra a residir, começou a compreender a sua religião por outra perspectiva.

 “Qual é a verdadeira religião? O que é que o Islão realmente ensina? No Afeganistão nós temos muita influência religiosa e temos muita influência cultural, por vezes é difícil distinguir, o que é o Islão e o que não é. O Islão não é duro, o Islão não proíbe as mulheres de se educarem, mas também não permite que se vá a um outro extremo, que é tirar tudo ou agir como se as mulheres fossem homens.

Com a minha vivência em Londres, comecei a compreender melhor a minha religião porque quando se está dentro de um quadro, não se consegue ver bem as coisas ao redor, mas quando se está fora, consegue-se ver a imagem do quadro mais claramente”, disse Sukaina.

Foi-lhe possível o contacto com todo o tipo de mulheres afegãs na sua província de Kabul, entre estas; conservadoras, liberais, tradicionais, mulheres muito modernas, outras não tão modernas. No que concerne às mulheres da sua família, entre duas a quatro décadas atrás, estas tiveram pleno acesso à educação, chegando mesmo a frequentar a universidade.

Estas mulheres perseguiam as suas qualificações, não como uma necessidade para ingressar em alguma profissão, uma vez que pertenciam a uma família com posses, simplesmente existia entre elas a noção que a educação é algo de bom, algo que lhes permite destrinçar entre o certo e o errado.

O casamento nesta família, ao contrário do caso de muitas mulheres afegãs, não acontecia numa idade muito jovem, sempre na casa dos vinte anos.

Sukaina refere que as mulheres da sua família desenvolveram um carácter muito forte, tendo aprendido a não serem completamente dependentes dos maridos, resultado do acesso à educação que estas obtiveram no passado. Tinham uma vida de casa normal e muitas delas tinham entre quatro a seis filhos para criar. O que as distinguia era o facto de terem tido a possibilidade de se instruir.

Naquele tempo, ao contrário do que acontece presentemente, a religião não tinha qualquer influência no modo de vida desta família de Kabul, no entanto, em muitas outras províncias do Afeganistão, precisamente na mesma altura, as mulheres afegãs tinham a religião muito mais presente nas suas vidas, cobrir a cabeça e o corpo, não só era uma obrigação da religião, como também era obrigatório em termos da sociedade.

Sair de casa sem usar hijab constituía motivo suficiente para serem atacadas, mas o mesmo não acontecia necessariamente em Kabul, onde as tias de Sukaina chegaram a usar mini-saias.

Em Kabul, experimentava-se uma grande sensação de liberdade, proporcionada pelo regime comunista vigente na altura, resultado da influência da União Soviética. “Especialmente nos tempos do comunismo, tudo o que as mulheres desejavam era mais liberdade, chegando até mesmo a ocupar lugares governamentais”, disse Sukaina.

Esta família viu-se obrigada a abandonar o Afeganistão em 1991, precisamente na manhã depois do dia em que os Mujahideen ocuparam Kabul. Cerca de duzentos Mujahideen passaram a noite na casa de Sukaina, na manhã seguinte a sua família foi mudada para o Paquistão, uma vez que o seu pai tomou consciência que a guerra iria estalar.

Os Mujahideen, que faziam parte da aliança do Norte, distinguiam-se dos Taliban por serem mais modernizados, mas ao mesmo tempo também eram muito religiosos. A aliança do Norte era maioritariamente constituída pelo grupo étnico Tajik, enquanto os Taliban, na sua maioria eram pertencentes à etnia Pashtun.

 Os Taliban são uma organização política, que esteve no poder por algum tempo no Afeganistão. Regem-se por um sistema de vida e por uma ideologia muito estritas em termos do Islão. Segundo a opinião de Sukaina, este grupo político fez um bom trabalho em muitas áreas, mas usou de técnicas erradas, como sendo o uso de armas para disciplinar o público, acrescentando ainda, que um dos ensinamentos do Islão diz que ninguém se torna religioso através do uso da força.

 “Se uma mulher fosse vista na rua sozinha, os Taliban iriam questioná-la de imediato, iriam querer saber qual a razão de ela estar ali, se ela não apresentasse nenhuma razão, então levava uma paulada”, disse Sukaina.

Durante o tempo dos Taliban muitos aspectos da vida em sociedade entraram em declínio. Conta que apesar dos Taliban, terem um pensamento extremamente religioso, todas as mudanças ocorridas eram mais relacionadas com influência política do que propriamente influência religiosa.

Esta jovem afegã diz discordar com muitos aspectos da ideologia dos Taliban, mas também considera que estes trouxeram muitas coisas positivas para o país, contribuindo para a redução da prostituição, consumo de álcool e abuso em termos gerais.

Tais aspectos negativos da vida em sociedade voltaram a ser mais proeminentes desde a chegada dos americanos ao Afeganistão. “Em termos da religião, eu penso que esta está a entrar em baixa nos dias de hoje, recentemente eu li numa publicação que mais de quinhentas casas de prostituição foram abertas só em Kabul, beber álcool tornou-se banal, a produção de drogas está extremamente elevada.

 Aliás, isto são coisas proibidas pelo Islão, mas estão à disposição em maior quantidade desde a chegada dos americanos”, disse Sukaina.

A sede do poder levou a que milhões de pessoas ficassem com as vidas destruídas, sendo que uma dessas nefastas consequências foi o facto da educação ter entrado em completa ruína, especialmente a educação das mulheres. “Devido aos políticos e ao facto de que toda a gente quer estar no poder, só por causa disso, milhões de pessoas têm morrido, inúmeras pessoas ficaram na miséria, as estruturas da educação desmoronaram-se por completo”, refere Sukaina.

As mulheres em Kabul não queriam usar hijabs, estavam a tornar-se extremamente modernizadas e liberais, sendo que perante esta situação, os Taliban decidiram proibir as mulheres de frequentar a escola, a determinada altura este regime político também decide banir as mulheres de saírem à rua, a não ser acompanhadas por um familiar do sexo masculino.

Para Sukaina, parece não existir um meio-termo no seu país, sobretudo em Kabul, onde se vai de um extremo a outro. “Eles nunca conseguem atingir um verdadeiro balanço, onde exista prática religiosa e consequente paz”, disse Sukaina. Considera que apesar do flagelo da guerra, o povo afegão, naquela mesma altura conseguia ser mais feliz fora de Kabul, com os seus valores tradicionais, algo que as mulheres da capital afegã recusavam considerando serem valores antiquados.

Estes aspectos antagónicos têm lugar neste país, devido às diferentes províncias que o compõem, as quais oferecem sempre uma perspectiva singular, diversas experiências, sensações e ideologias.

Indigna-se contra o que diz ser o pior tipo de opressão, realizado sobre as mulheres afegãs nos dias de hoje, ou seja, a falta de acesso à educação. Muitas famílias afegãs preferem que os rapazes frequentem a escola, enquanto que as raparigas ficam em casa sem saber escrever nem ler. Também existe opressão sobre as mulheres, mas só pelo facto de estas serem do sexo feminino são consideradas quase inúteis, uma vez que um rapaz pode trabalhar fora e ajudar a sustentar a família.

As mulheres afegãs são também extremamente corajosas, pois devido às circunstâncias da guerra, milhares de afegãs tornaram-se viúvas, muitas delas com dez crianças para criar. Estas pessoas vivem em extrema pobreza sem dinheiro para comprar comida.

Esta jovem mulher afegã gostaria de ver a situação do seu país alterada, sobretudo em termos da educação. Acredita que se uma mulher obtiver instrução a próxima geração virá a ser beneficiada. “Uma mãe instruída tornar-se-á a primeira educadora de sempre para uma criança”, disse Sukaina.

Algumas mudanças têm ocorrido neste campo nos anos passados, onde foram abertas muitas escolas, algumas com acesso às raparigas. Estão também em curso novos projectos em todas as províncias do Afeganistão, não só em Kabul.

Sukaina está com um pensamento positivo em relação ao crescimento na área da educação e acredita que o facto de proporcionar às mulheres afegãs pleno direito à educação irá culminar no aumento da sua auto-estima e consequente desenvolvimento do seu país.

Vanda Caldeira

Este texto foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

quarta-feira, fevereiro 16, 2011

"O NOSSO OBJECTIVO Nº1 É A INTEGRAÇÃO NA UNIÃO EUROPEIA"



Numa altura em que Radovan Karadic está a ser julgado pelo Tribunal Internacional de Justiça em Haia, o seu país enfrenta vários desafios. Com uma economia em franco crescimento entre os países da região dos Balcãs e com uma maior estabilização política, a ambicionada candidatura para integração na União Europeia, que é aliás o grande objectivo da diplomacia da Sérvia, tem sido dificultado pela fuga à justiça do General Ratko Mladic. A questão do Kosovo entra para o próximo ano, numa nova etapa com a decisão do Tribunal Internacional de Justiça das Nações Unidas no que diz respeito à declaração unilateral de independência feita pelos albaneses do Kosovo.Na grande Entrevista dada à Raia Diplomática, Dusko Lopandic, Embaixador da Sérvia em Portugal há cerca de dois anos, responde às grandes questões que afectam a diplomacia sérvia, bem como questões relacionadas com os laços existentes entre a Sérvia e Portugal, os quais foram ultimamente dinamizados com a criação de um curso de Língua e Cultura Sérvia, no passado ano de 2008.

 
O Tribunal Internacional de Justiça das Nações Unidas, vai pronunciar-se em inícios de 2010, sobre a declaração unilateral de independência do Kosovo. O que é que a Sérvia espera desta decisão?

Este problema tem uma longa história. Eu só queria relembrar que a Sérvia esteve envolvida em negociações com a comunidade internacional em 2005/2006 e no fim destas negociações houve a declaração de independência por Pristina. Sendo que, no nosso ponto de vista as negociações ainda não acabaram e esta decisão é ilegal, quer pelo ponto de vista interno mas também pelo ponto de vista das Nações Unidas, porque o Kosovo ainda está a sob domínio da resolução do conselho de segurança das Nações Unidas e não há nenhuma decisão do conselho geral das Nações Unidas para mudar a sua anterior resolução, na qual o Kosovo faz parte da jurisdição internacional. Então, o que nós fizemos de seguida, foi dirigir a nossa palavra à Assembleia Geral das Nações Unidas porque obviamente o Conselho de Segurança não podia tomar nenhuma decisão e a Assembleia Geral de todos os países das Nações Unidas votaram em larga maioria esta questão para o Tribunal Internacional de Justiça, se esta decisão da autoridade de Pristina foi legal ou não, é agora este o debate. Houve uma minoria de países que reconheceram Kosovo, a maioria dos membros das Nações Unidas não reconheceu e alguns países estão a participar no debate no Tribunal Internacional de Justiça. Obviamente, nós somos da opinião que a lei internacional está do nosso lado e que a opinião que será proferida no ano que vem, dará razão à Sérvia. Eu gostaria também de salientar que esta é a primeira vez que um assunto tão complexo, tem sido tratado pacificamente e sem quaisquer reacções violentas. Nós estamos a tentar procurar uma solução legal e não outro tipo de solução.

 
Neste processo de separação unilateral do Kosovo, a Sérvia consultou vários juristas de renome mundial. Tendo por base o direito internacional, o que defenderam os peritos?

Provavelmente existem tantas posições quanto a existência de especialistas. Esta questão de separação não é algo assim tão simples, mas eu penso que pelo ponto de vista da maioria dos juristas, estas questões não podem ser tomadas unilateralmente, sendo que por isso a maioria dos estados tem tomado reservas em relação à independência do Kosovo. Este é um dos pontos principais que nós estamos a dar mais ênfase, se existe um processo de separação e de auto-determinação, qualquer medida concreta deverá ser tida em conta antes de tais negociações tomarem lugar. Nós pensamos que não seja suficiente, que uma parte do território, na qual uma minoria está em maioria decida separar-se do país e assim formar um novo país. Tendo em conta toda a Sérvia, o território do Kosovo constitui menos de 20% da Sérvia. Existem muitos países que também têm 20% ou 30% de minorias, se nós aceitarmos esta ideia que toda a parte de um território com minorias pode declarar independência, então iremos acabar em completo caos. É por esta razão que eu penso que a opinião do Tribunal, assim como a maioria das opiniões legais estarão do nosso lado.

 
Muitos países reconheceram a independência do Kosovo. Depois desta tomada de posição, as relações diplomáticas entre a Sérvia e estes países alteraram-se?

Nós temos perfeita noção que existem países que reconheceram a independência do Kosovo e outros não, obviamente que nós também vemos os países sob este ponto de vista. Mas nós também temos em consideração muitos outros elementos, como por exemplo, não é a mesma coisa se os nossos vizinhos dos Balcãs fizerem alguma coisa, ou se são alguns países afastados a fazê-lo.

 
Portugal foi o único país que reconheceu a independência do Kosovo de que o governo sérvio não retirou o seu embaixador como protesto. Porque razão há esta relação especial com Portugal?

É claro que nós tomámos nota da posição de Portugal, a qual reconhece a independência do Kosovo. Portugal fê-lo por causa da sua aliança com os outros, eu não vi grande entusiasmo da parte de Portugal para reconhecer o Kosovo. No meu entender, esta medida foi tomada devido a pressões externas e a maioria dos países que reconheceram o Kosovo, fizeram-no por causa de pressões externas, feitas principalmente pelo Estados Unidos e alguns outros grandes países europeus. Pelo que, nós não cortámos relações diplomáticas com Portugal, nas nossas relações bilaterais, nós tentamos isolar esta questão das outras questões. Em cada caso existe uma situação diferente, por exemplo, no momento em que Portugal tomou uma decisão, foi antes do debate na Assembleia Geral relacionado com a opinião legal do Tribunal Internacional. Sentimos que é muito mais negativo para nós, o reconhecimento do Kosovo depois desta decisão porque todos devem esperar pela decisão do Tribunal. Portugal fê-lo, eu diria, num momento em que para nós não foi tão problemático, se bem que, obviamente, o reconhecimento de independência do Kosovo é um problema para nós, não é algo que vai desaparecer. Isto é um dos principais assuntos das nossas relações externas, sendo que nos encontramos em discussões com todos os países do mundo.

 
Coloca-se a possibilidade da Sérvia reintegrar o Kosovo no seu território?

O que nós dizemos agora, é que vamos continuar a esperar pela opinião do Tribunal Internacional de Justiça e nós iremos obviamente, propor a continuação das negociações assim que tenhamos uma opinião legal. Para nós, as negociações não foram finalizadas. Em 2007 o Kosovo declarou independência, isto é para nós uma espécie de interrupção nas negociações e ainda estamos à espera que estas sejam retomadas, como será o resultado no final, é algo que será ditado pelas negociações, mas acreditamos verdadeiramente, que alguma espécie de solução bilateral e não unilateral será encontrada.

 
Dado que 22 dos 27 estados-membros da União Europeia Já reconheceram a independência do Kosovo, a posição da Europa perante a independência do Kosovo pode ser um obstáculo às negociações para a adesão da Sérvia à UE?

Até agora, não existe nenhuma posição que diga que o Kosovo possa ser alguma espécie de limitação para a Sérvia. Nós assinámos recentemente o acordo de Associação e Estabilização com a União Europeia. Estamos a ter problemas com um país, a Holanda, que não aceitou a nossa candidatura, pedindo que a Sérvia cooperasse na íntegra na captura do general Ratko Mladic, mas infelizmente a nossa polícia não foi capaz de encontrá-lo nos últimos dois anos, nós estamos a tentar. Eu penso que a Sérvia não deveria ser prejudicada neste processo de alargamento da União Europeia por causa disto. O actual relatório da Comissão sobre o progresso de prováveis membros dos Balcãs para integração na União Europeia resultou numa posição bastante positiva no que concerne à Sérvia. Um dos elementos positivos que acontecerá muito em breve será a liberalização dos vistos, o que quer dizer que os cidadãos Sérvios não estarão obrigados a partir do próximo ano a requerer vistos. Os procedimentos relativos aos vistos são muito difíceis e complicados, limitam o movimento de pessoas. Em termos políticos também será um bom sinal para nós, ou seja, quer dizer que podemos progredir no processo de integração na União Europeia.

 
E se a União Europeia colocasse a condição da independência do Kosovo como imperativo para entrada da Sérvia na UE. Qual seria a posição da Sérvia?

Isto é algo que tem sido respondido quer pelo nosso Presidente, quer pelo nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou seja, nós nunca iremos em nenhuma circunstância reconhecer o Kosovo como país independente, para além de que, o nosso Ministro já disse que se tal hipotética condição fosse posta à Sérvia, então, nós não iremos solicitar a nossa entrada na UE. Mas se não existe consenso dentro da União Europeia, em países como a Espanha, Eslováquia, Roménia, os quais não reconheceram o Kosovo como país independente, então não vejo razão para a União Europeia nos colocar esta condição.

 
A Comissão Europeia propôs recentemente que, em 2010, já não sejam necessários vistos para os cidadãos sérvios que circulam na UE. Este pode ser um sinal sobre o empenhamento da Europa na adesão da Sérvia?

É obviamente um sinal muito positivo, nós ficaremos muito agradados com esta medida. Os vistos são um grande problema para nós, principalmente para a parte mais activa da população; jovens, estudantes, empresários, artistas, aqueles que mais viajam são travados. Esta medida irá beneficiar a Economia, por exemplo, contribuirá para o aumento do turismo. Presentemente, as nossas agências de turismo deparam-se com imensas dificuldades, devido aos problemas que os vistos envolvem. Sem a necessidade de vistos, iremos beneficiar tanto em termos de política e atmosfera no país, como também em termos da economia e negócio.

 
O Partido Radical e o Partido Democrático, têm opiniões diferentes no que diz respeito à integração da Sérvia na EU. Este facto acresce ainda mais dificuldades a este processo?

Eu diria que de acordo com as sondagens, existem cerca de dois terços da população que apoiam a integração na União Europeia, existe portanto um grande consenso. Presentemente, temos uma grande coligação no Governo de Belgrado, cerca de treze partidos estão dentro da coligação. O Governo é dirigido pelo Partido Democrático, o partido do Presidente Tadic. Por outro lado, o Partido Radical foi dividido em dois, após as últimas eleições. O chamado Partido Progressivo é menos radical, em comparação com o clássico Partido Radical, sendo que este novo partido é muito mais flexível no que diz respeito a esta problemática sobre a União Europeia. Então, eu penso que se pode dizer que existe uma maioria para a União Europeia no Parlamento sérvio, como também na opinião pública.

 
Se a Sérvia aderir à EU, quais serão as vantagens para a Sérvia?

Esta é uma pergunta clássica para todos. Eu penso que esta é a questão mais premente que se põe agora com o Tratado de Lisboa e que diz respeito, por exemplo, a países como a República Checa e o Reino Unido. Eu tomo sempre em consideração o exemplo de Portugal. Eu penso que a adesão na União Europeia foi útil para Portugal, permitindo a modernização da economia e infra-estruturas, mas também passou a ser um país mais aberto à Europa e à Espanha, seu vizinho. Sendo que é precisamente isto que nós esperamos da União Europeia. Quando estive na Sérvia, tive a oportunidade de discutir em diferentes lugares, pequenas e grandes cidades, acerca da utilidade da União Europeia, o porquê de nós estarmos a tentar entrar na União Europeia. Eu penso que as pessoas compreendem, sem qualquer grande explicação, que a União Europeia é uma ponte para as relações pacíficas. Isto é algo muito importante para todos nos Balcãs. Em primeiro lugar, nós temos muitas questões difíceis com os nossos vizinhos, não queremos mais guerras sangrentas e a União Europeia pode ajudar na resolução dos nossos conflitos. Ao contrário de Portugal e Espanha, o nosso caso é muito mais complicado, pois nós temos oito vizinhos e com cada um deles temos diferentes questões ou simplesmente, diferentes relações históricas. Em segundo lugar, a Sérvia já se encontra economicamente desenvolvida como tal, a entrada na União Europeia seria extremamente benéfica para atrair novos investimentos. A entrada na União Europeia permitirá também a modernização em diferentes campos como a administração e legislação. Este processo de integração é extremamente complicado, mas também muito positivo para um país.

 
No início dos anos 90, a Federação Russa encontrava-se muito debilitada, hoje é conhecido o seu potencial económico, sobretudo a nível das riquezas energéticas. Actualmente como são as relações entre a Rússia e a Sérvia?

As nossas relações são excelentes, nós somos bons parceiros. Há alguns dias atrás, o Presidente Medveded esteve em Belgrado e nós assinámos diversos acordos no campo da cooperação económica. Um dos principais acordos tem a ver com o trânsito de gás, vai haver uma conexão entre as fontes de gás russas e consumidores europeus através do Mar Negro e os Balcãs, sendo que nós fazemos parte deste processo. Esta conexão tem o nome de South Stream. Nós temos a ajuda da Rússia em um bilião de dólares na nossa economia. A Rússia é obviamente um importante parceiro, suportando-nos nesta questão de integridade territorial respeitante ao Kosovo. Por todos estes aspectos, a Rússia é um importante parceiro para a Sérvia, mas o nosso objectivo número um é a integração na União Europeia.

 
A TAP tem voos regulares entre Lisboa e Zagreb, o que pensa ser necessário para existirem voos directos entre Lisboa e Belgrado?

Eu não sei, esta é uma boa questão. Eu ficaria extremamente agradado com a existência de voos directos para Belgrado, pelo menos uma vez por semana. Provavelmente, o que nós precisamos é um aumento de pessoas, de consumidores. Talvez estejam cerca de mil Sérvios a viver em Lisboa e eu estou certo que haveria muitos turistas Sérvios em Portugal se existissem voos directos. Então, eu diria que existe interesse em explorar a possibilidade de uma ligação directa.

 
Em 2008 foi criado o curso de Língua e Cultura Sérvia na Universidade de Lisboa, como se tem revelado o interesse dos alunos portugueses?

Nós ficámos surpreendidos pelo interesse positivo dos estudantes, tivemos no primeiro ano cerca de 20 estudantes, que até é um número bastante grande para tal língua. Eu espero que possamos continuar com esta cooperação em diferentes campos, eu penso que a cultura é uma área extremamente importante para a nossa cooperação. Na Sérvia todos conhecem o Fado, cantores e grupos portugueses como também alguns jogadores de futebol. Em Portugal muitas pessoas conhecem Emir Kusturica, um famoso director em alguns musicais, ele tem um grupo chamado “No Smoking Orchestra” e com regularidade vem a Portugal, diz ter também muito apoio em Portugal. Quando eu estive num concerto com três mil pessoas, foi realmente impressionante ver como os portugueses conheciam a sua música. Então, existe algum conhecimento recíproco das nossas culturas. Por exemplo, a tradução de livros, é uma área que não está suficientemente desenvolvida em ambas as partes, apesar de nós tentarmos financiar algumas traduções de livros. O Instituto de Camões está a ajudar no ensino de português na Sérvia. Em suma, eu penso que existe progresso e um melhor conhecimento em geral das duas culturas.

 
Em pleno século XXI, qual é a visão da Sérvia acerca de Portugal?

Como eu já referi, existe interesse da Sérvia por Portugal. Eu penso que povo Sérvio tem uma grande simpatia por Portugal, talvez por ser também um país pequeno, nós somos parecidos em termos de dimensão e população, mas provavelmente e em primeiro lugar, este interesse advém também do ponto de vista cultural com as suas diferenças e conexões. Por exemplo, no folclore do Minho existem aspectos que eu consigo identificar com o folclore Sérvio, isto é muito interessante. Na Sérvia, as pessoas olham para as diferenças e similitudes entre as nossas culturas, sendo que é por isso que Portugal é tão popular na Sérvia. Em segundo lugar, existe um grande interesse dos Sérvios para visitar Portugal, o interesse dos turistas é de facto muito grande.

 
O que falta para aumentar as relações culturais e económicas entre Portugal e a Sérvia?

Sim, o que nós precisamos neste momento é o aumento das nossas relações económicas, sendo que isso é algo que vai ajudar em outras áreas. Nós continuamos a não ter sérios investimentos, feitos por Portugal na Sérvia ou feitos pela Sérvia aqui, apesar de estarmos a trabalhar com afinco nesse sentido. Eu posso desde já mencionar, que este ano assinámos dois acordos, o primeiro destes acordos visou a promoção de investimento entre Portugal e Sérvia, o segundo foi acerca da cooperação na Defesa. Existem muitos negócios nesta área. Existem algumas outras áreas, nas quais será interessante investir como a energia, informática, comunicações, indústria alimentar e muitas outras mais.

 
Quais são as maiores diferenças culturais entre Portugal e a Sérvia?

Bem, a grande diferença talvez seja em termos de continuidade, a nossa história é pautada por muita descontinuidade porque nós estamos num cruzamento de países e fomos com frequência ocupados por outros países. Infelizmente, estivemos envolvidos na Primeira e Segunda Guerras Mundiais e tivemos muitas baixas com essas participações, isto fez com que a história da Sérvia seja caracterizada por muita agitação e mudança. A história de Portugal é muito mais contínua, só para começar, as suas fronteiras datam do século XII, algo que não é imaginável nos Balcãs, umas vez que nós tivemos tantas mudanças nas fronteiras e deslocações da nossa população. Então, eu diria que esta é a nossa grande diferença em termos históricos, mas se tivermos em conta, nos dias de hoje, a população de ambos os países, temos muitos mais aspectos em comum do que diferenças. Outra diferença dos dias de hoje, está relacionada com a emigração. Portugal tem muitos emigrantes, por enquanto nós continuamos sem emigrantes, talvez apenas alguns chineses.

 
Está a viver em Portugal há cerca de dois anos, sente alguma afinidade com a cultura portuguesa?

Sim, eu estou muito interessado, estou a aprender a língua e os meus filhos frequentam a escola portuguesa. Enquanto família, tentamos estar integrados neste país e compreender a cultura e o povo português. Nós apreciamos tudo, desde o clima até à cultura, música, literatura, comida. O meu português está a melhorar, eu consigo compreender muito melhor, já consigo ler livros em português. Contudo, quando se está num ambiente estrangeiro e quando todos os portugueses com quem eu contacto falam línguas estrangeiras, não me sinto tão obrigado a falar em português. É totalmente diferente quando se está na Espanha, onde quase todas as pessoas só falam em espanhol. Tenho a possibilidade de tentar exercitar o meu português quando visito a escola dos meus filhos.

Esta entrevista foi publicada na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009



MACAU - UMA DÉCADA COMO REGIÃO ESPECIAL DA CHINA


Macau completa, no dia 20 de Dezembro, o seu 10º aniversário como região administrativa especial da República Popular da China. No mesmo dia toma posse do cargo de chefe do Executivo, sucedendo a Edmund Ho Hau Wah, o até há poucos meses secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Fernando Chui Sai On, com ele iniciando-se um novo ciclo muito marcado, porém, pela continuidade de pessoas e de políticas.

Qualquer balanço correcto desta primeira década revela, inequivocamente, o sucesso da aplicação do princípio “um país, dois sistemas” e a solidez do trabalho realizado, pela administração portuguesa, no período de transição, sendo também justo reconhecer que o acordo firmado com Portugal, em 1987, foi respeitado, gozando a região, efectivamente, de ampla autonomia, sob o acompanhamento sempre atento das autoridades centrais chinesas.

Os resultados são francamente positivos, registando-se um impressionante desenvolvimento económico e, consequentemente, um invejável desafogo financeiro, pese embora a excessiva dependência em relação às abundantes receitas geradas pelos jogos de fortuna ou azar, e não obstante alguns assinaláveis acidentes de percurso e visíveis desequilíbrios que não foram suficientemente acautelados e que resultaram, em especial, do rápido crescimento verificado.

A sua correcção constitui, agora, a maior prioridade, e também o maior desafio, na acção governativa nos próximos anos, estando a atenção da população, mais exigente e interventora, muito insistentemente virada, também, para o reforço de medidas de combate à corrupção e à ilegalidade administrativa.

Merece, igualmente, menção o reforço das relações com os Países de Língua Portuguesa, desejando a China que Macau faça uso pleno desta sua mais-valia que é a ligação histórica, cultural e comercial ao mundo lusófono, cabendo também a Portugal saber tirar maior proveito deste desígnio pragmaticamente expresso e constantemente reafirmado.

A classificação, pela UNESCO, do centro histórico da cidade como património mundial contribuiu, por outro lado, para garantir uma intervenção mais consequente e correcta na preservação do legado histórico e arquitectónico, ainda mais importante agora face às ameaças de descaracterização que abundantes e desproporcionadas construções ligadas aos novos operadores dos casinos vieram trazer.

De acordo com um recente documento governamental central, estabelecendo directivas e metas económicas, até 2020, para todo o vasto delta do Rio das Pérolas, uma das zonas de mais espectacular desenvolvimento em todo o mundo e onde Macau se insere, privilegiam-se, para esta região, o papel de plataforma de cooperação com o mundo lusófono e o de grande e diversificado centro de turismo, valorizado pela existência, exclusiva em todo o território chinês, de modalidades diversas de jogos de fortuna ou azar e orientado, complementarmente, para congressos e convenções, incentivos e grandes espectáculos.

Abrem-se, assim, para os interessados, renovadas e aliciantes oportunidades de participação e de investimento na próxima década.


Jorge Rangel é Presidente do Instituto Internacional de Macau

Este artigo de opinião foi publicado na edição nº0 da revista Raia Diplomática, no dia 28.11.2009

terça-feira, fevereiro 15, 2011

QUE MILAGRE EUROPEU?



 
Porquê o “milagre europeu”?

Por que razão as economias modernas encontraram o ponto de partida para o seu desenvolvimento global na experiência do subcontinente europeu? Para E.L. Jones, estamos perante a convergência de factores – o meio ambiente e o sistema político -, o que não aconteceu, por exemplo, com o Império Otomano, ou com a Índia e a China.

Foram a descentralização política e as raízes culturais, bem como o sistema económico comum, que favoreceram a tendência. E.L. Jones escreveu “O Milagre Europeu” (Gradiva, trad. de Edgar Rocha, 2002), que, pode dizer-se, é já um clássico das análises contemporâneas sobre as vantagens comparativas do nosso continente.
Porquê os Europeus? Esta pergunta tem razão de ser, mas muitas vezes não é feita, talvez por receio de eurocentrismo. No entanto, ao vermos a situação geográfica deste cabo da Ásia, percebemos que houve uma convergência de factores próprios, com repercussões indiscutíveis na história da Europa e do Mundo, que não podem deixar de ser devidamente estudados. Numa conferência de 1755, Adam Smith disse que “pouco mais é necessário para levar um estado de barbarismo para a opulência, do que a paz, impostos baixos e razoável administração da justiça; tudo o mais vem naturalmente com o curso dos acontecimentos”.

Talvez devamos começar por aqui, no entanto, não há uma chave única ou uma resposta uniforme. É preciso compreender as circunstâncias e em especial o facto de na Eurásia, nos séculos XVI, XVII e XVIII ter havido quatro sistemas político-económicos: o Império Otomano, no Próximo Oriente, o Império Mughal, na Índia, os Impérios Ming e Manchu, na China, e o sistema de Estados da Europa. Enquanto os impérios otomano, mughal, e manchu foram despotismos militares estranhos ao corpo da sociedade, que limitavam drasticamente as perspectivas de desenvolvimento, o que foi agravado pelo colonialismo, pela abertura forçada dos portos e pelos acordos comerciais desiguais, na Europa houve condições favoráveis à descentralização e à difusão dos progressos.

Não pode esquecer-se ainda que a localização da Europa favoreceu as vantagens próprias, desde o afastamento em relação às estepes da Ásia Central e dos efeitos das devastações provocadas pelos cavaleiros nómadas até à proximidade dos circuitos económicos e comerciais do Mediterrâneo e do Atlântico. Como afirma E.L. Jones: “A Europa tinha condições de contexto, localização e recursos de tal forma especiais que somos obrigados a agarrar esse espinho que é a explicação ambiental” A variedade política, a acumulação de capital e o comércio são factores parcialmente explicáveis pelas condições específicas da Europa relativamente ao meio geográfico e aos recursos”.
Benjamin Franklin afirmou que “a felicidade humana provém menos de grandes golpes de sorte, os quais raramente acontecem, do que das pequenas vantagens que ocorrem todos os dias”.

A complexidade das situações, a diversidade das circunstâncias obrigam a perceber que no caso europeu houve uma confluência de factores que suscitaram o “milagre”. Se W.W. Rostow analisou o crescimento segundo a sequência de Adam Smith – benefícios do comércio, alargamento do mercado, especialização por regiões – a verdade é que na China houve falta de transição natural e irresistível do comércio para a manufactura. A roda de fiar cânhamo, movida a água, e outros progressos conhecidos no século XIV, para não falar das navegações até à costa oriental de África, poderiam ter tido efeitos extraordinários, no entanto o uso das máquinas foi abandonado (por razões desconhecidas que poderão ter a ver com contradições e conflitos interno na dinastia Ming), com consequências inevitáveis de regressão. Também no império otomano a tipografia foi introduzida em 1726 em Constantinopla, mas a experiência foi interrompida entre 1730 e 1780, tendo sido produzidos apenas 63 títulos de 1726 a 1815. Note-se que a taxa de alfabetização era no centro da Europa então de 50 por cento, em comparação com os 5 por cento na Turquia, isto é, “uma diferença de 10 vezes, enquanto a diferença entre as taxas de publicação era de 10 mil”. Daí que os mercadores dos Balcãs tenham tido necessidade de infringir as regras turcas para conseguirem ter acesso a livros e jornais importados das cidades europeias”. E como estamos longe da certeira e oportuna metáfora de Meyerhof sobre o papel dos árabes na Europa do final da Idade Média: “os cientistas islâmicos reflectiram o Sol helénico depois de o dia terminar, iluminaram a sombria Idade Média europeia como uma Lua, acrescentaram algumas estrelas brilhantes, mas desapareceram com a Renascença”. Em contraponto, a Europa pôde beneficiar da abertura e do contacto entre zonas mais e menos desenvolvidas, num intercâmbio muito rico.

E o caso dos Descobrimentos é bem ilustrativo, beneficiando os portugueses da fecunda circulação de ideias e de informações do Mediterrâneo.

Pierre Chaunu (1923-2009), falecido na última semana, esclarece-nos sobre quais eram as motivações portuguesas: “para a burguesia obter terra para plantações de cana-de-açucar; para a aristocracia, simplesmente obter terra; para o Estado, obter fontes de abastecimento de cereais, dado que as colheitas eram insuficientes um ano em cada três e que o país estava cada vez mais dependente das fontes marroquinas. Estes eram os interesses principais, embora também estivessem presentes a curiosidade, o espírito missionário e de cristianização, assim como a procura de ouro”.

 E lembramo-nos do que disse Vasco da Gama ao judeu de Calecute: vimos em busca de ouro, cristãos e especiarias… E tudo vinha, afinal, do conhecimento de que os árabes tinham chegado bastante ao sul ao longo da costa oriental de África.

 Por isso, os portugueses enviaram mensageiros a Ormuz e outros lugares, a fim de tentarem recolher informações seguras sobre o extremo sul de África, principalmente judeus, pois podiam contar com o apoio de comunidade judaicas existentes ao longo das rotas comerciais.
Verifica-se facilmente que os europeus não foram nem os únicos nem os primeiros grandes comerciantes. O que aconteceu foi a reunião de condições especialmente favoráveis que corresponderam a um caso de sucesso na resposta aos estímulos. “O que distinguiu o caso europeu foi o notável aumento do comércio de grande volume ligando regiões bastante afastadas, o carácter multilateral e o facto de negociar bens de consumo corrente, e não apenas os bens sumptuários que sempre tinham dominado o comércio de longo curso”.

Verificamos haver uma extraordinária capacidade para aproveitar oportunidades. Isso foi-se dando ao longo do tempo, de um modo gradual e estável. “Foi o conjunto (diz E.L. Jones), e não um elemento único miraculoso, que produziu os resultados que conhecemos.

Um contexto relativamente estável e, principalmente, os limites às arbitrariedades devidos a um cenário político concorrencial, foram condições fundamentais para o crescimento e o desenvolvimento.

A Europa escapou aos perigos de gigantescos impérios centralizados, o que não aconteceu na Ásia. Para além disso, o desenvolvimento europeu resultou de um processo cumulativo histórico”.

Se falamos de um “milagre” referimo-nos a uma reunião de factos excepcionais. Deles temos de ter consciência. Hoje, a Europa confronta-se com o desafio da coordenação, ao invés da harmonização. Uma União de Estados livres e soberanos tem a seu cargo a missão de seguir as boas lições e os exemplos positivos.


Guilherme d' Oliveira Martins é Presidente do Tribunal de Contas, do Centro Nacional de Culrura e membro do Conselho Editorial da revista Raia Diplomática

Este texto foi publicado na revista Raia Diplomática no dia 28.11.2009