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sábado, fevereiro 05, 2011

A TRANSFORMAÇÃO DAS RELAÇÕES LUSO-ESPANHOLAS NO MARCO DA CONSTRUÇÃO EUROPEIA - AS IMPLICAÇÕES ECONÓMICAS - 3ª PARTE



Uma das consequências diretas da adesão de ambos os países à UE foi a formação de um mercado regional (ou sub-regional se quiserem) dentro do mercado único europeu (Cravinho, 2001: 78). Os motivos são evidentes embora com antecedência as condições políticas fizessem com que ambas economias viveram voltadas de costas. No entanto ainda há portugueses que prefeririam que situação houvesse ficado assim. Tentemos examinar alguns dos motivos.

Nos últimos anos as exportações espanholas a Portugal ultrapassaram os 15.000 milhões de euros, o que supõe mais de um terço do total das importações portuguesas (isto é, mais do qualquer outro provedor). No entanto, as exportações portuguesas à Espanha representam pouco mais de 8.000 milhões de euros, ou o que é o mesmo, uma cota de mercado de 3,21% (oitavo subministrador), evidenciando-se um claro défice comercial (Jiménez, 2007: 190, 209-210; Porto, 2007: 120; Cruz, 2001: 19).

As inversões espanholas em Portugal também resultam polémicas, especialmente pelo fato de muitas apontarem para sectores considerados estratégicos. Por exemplo, os grupos espanhóis controlam já mais de 15% do mercado bancário português assim como importantes empresas em outros sectores. Não questionamos aqui o caráter positivo ou negativo desta presença, mas sim a crença generalizada de que a desigualdade nesta equação seja devida à ausência de empreendedorismo em Portugal. Certamente, apenas em 2004 superou a inversão portuguesa na Espanha às operações do vizinho, e ainda assim, dos 2.700 milhões de euros invertidos por empresas portuguesas, 2.600 correspondiam-se com a compra pela EDP de 66,2% da elétrica Hidrocantábrico.

Mas não fora essa a única tentativa empresarial portuguesa no Estado espanhol. Espanha vetou ilegalmente a compra de ENCE, empresa de celulosa radicada na Galiza, por Portucel, alegando a sua condição de empresa pública. No entanto, agora a mesma empresa irá para o Rio da Prata. Espanha vetou também a proposta da portuguesa Sonae, maior produtor de paineis de aglomerado do mundo, porque as autoridades alegaram a condição estratégica do sector florestal. O mesmo aconteceu inicialmente com a OPA da EDP a Hidrocantábrico, embora nesta ocasião não foi possível evitar a legalidade (Alcaide, 2001: 107).

Evidentemente a Espanha usa diferentes critérios em função dos seus interesses. Quando se trata de defender a presença espanhola em Portugal aponta-se para a inevitabilidade do cumprimento das normas de livre mercado e livre competência da UE. No entanto, quando o vento sopra do outro lado e os interesses são contrapostos há lugar para as excepções e violações das cláusulas do tratado da união [Lembre-se que no artigo 295 do Tratado se explicita: “o presente tratado não prejulga o regime de propriedade dos estados membros”).

É certo que a economia espanhola na última década, e até o seu colapso no marco da actual crise económica, cresceu a um ritmo significativamente superior do que a portuguesa, com uma produtividade média mais próxima aos valores europeus. Aproveitando esta conjuntura de desequilíbrio, a Espanha é responsável pela geração de tensões neste mercado, esquecendo-se da prudência, responsabilidade e sensibilidade precisas, por não mencionar o princípio básico de reciprocidade. A racionalidade económica não pode sustentar-se num lucro imediato que destrua ou enfraqueça as sinergias futuras (Cravinho, 2001: 79).

Joám Evans Pim, Director do Instituto Galego das Relações Internacionais e da Paz

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