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domingo, fevereiro 06, 2011

A TRANSFORMAÇÃO DAS RELAÇÕES LUSO-ESPANHOLAS NO MARCO DA CONSTRUÇÃO EUROPEIA - DESENVOLVIMENTO REGIONAL E A GESTÃO DE RECURSOS - 4ª PARTE



Há quem tem apontado para o modelo do Estado espanhol em relação ao processo de regionalização na hora de configurar as estratégias a se implantar em Portugal. O crescente relacionamento entre as estruturas políticas regionais portuguesas e espanholas no marco das denominadas euro-regiões tem evidenciado a escassa capacidade de manobra e poder efectivo dos representantes portuguesas, confrontados com instituições relativamente mais fortes na Galiza, Castela-Leão, Estremadura e Andaluzia. Enquanto para diversas questões as administracções autonómicas espanholas são órgão último e suficiente de decisão, em Portugal faz-se necessário a consulta em Lisboa, dificultando assim a capacidade de gestão e decisão das estruturas fronteiriças. Obviamente, em Portugal não existe o grave problema nacional do Estado espanhol, o que não exclui que regiões como o Norte olhem para Galiza na hora de definir as suas aspirações políticas. Tudo isto no marco de uma crescente para-diplomacia regional que já ganhou proporções exteriores: pense-se nas novas delegações galegas em Buenos Aires e Bruxelas (independentes do corpo diplomático espanhol).

Independentemente, não cabe dúvida sobre a importância do fortalecimento das estruturas de cooperação fronteiriça (as euro-regiões) como motor de dinamismo das regiões do interior português, algumas das quais sofrem desde faz décadas um agudo processo de desertificação (no sentido económico e populacional). Ainda assim, também não se pode pensar que o seu desenvolvimento virá dado pela superioridade dos territórios além da raia. Não se esqueça o precário estado dos territórios limítrofes com Portugal (Andaluzia, Estremadura, Castela-Leão e Galiza). A turistificação, e por tanto terciarização, da economia, desmantelando os sectores produtivos estratégicos, deixa pouco que oferecer ao intercâmbio, especialmente nos actuais tempos de crise. A solução, portanto, vem dada pelo desenvolvimento conjunto.

As euro-regiões têm aportado uma nova e crescente vitalidade a territórios da fronteira luso-espanhola que, a diferença do modelo pirenaico e, salvado as distâncias, até do campo de Gibraltar, sofreram as duras consequências seculares do antagonismo peninsular, não apenas no âmbito político e económico, mas também, incipientemente, no do ensino, da sociedade civil e do trabalho. As continuas migrações desde estas regiões, os problemas de infra-estruturas, de educação e de facilidades para o empreendedorismo podem ver-se aliviadas pelos acordos de cooperação multisectoriais. Vejamos algumas medidas possíveis:

 

- Valorização decidida dos centros de actividade e criação de mecanismos de atratividade e complementaridade empresarial trans-fronteiriça. Transformar assim as periferias desvalorizadas em verdadeiros centros de intercâmbio e cooperação, dotando-os de serviços e condições necessárias para a promoção económica (Porto, 2007: 121). Destas políticas não se pode excluir às regiões costeiras e às políticas pesqueiras.

- Inversão decidida e racional na melhora das comunicações terrestres, potenciando os nós de transporte internacional existentes (aeroporto Sá Carneiro – com uma política ativa desde faz anos - ou Porto de Leixões em relação à Galiza) e outras plataformas logísticas intermodais. A necessidade de completar a rede trans-europeia de estradas depende de ambos os governos (pense-se, aqui pertinho, na conexão à Galiza pelo litoral ou as conexões desde Chaves e Bragança). Adicionalmente, não seria absurdo iniciar estudos exploratórios da navegabilidade pelas vias fluviais do interior (Martins da Cruz, 2001: 34-35).

- A ligação do TGV precisa também de um compromisso claro. Em um primeiro momento a rede de conexão ferroviária estava prevista seguindo quatro eixos: Porto-Vigo, Lisboa-Madrid, Aveiro-Salamanca e Faro-Huelva. Finalmenete parece que apenas haverá duas conexões a curto prazo: Madrid-Lisboa e, já sem data prevista, Porto-Vigo. As restantes conexões descartaram-se ou ficaram para mais perto do fim da próxima década.

- Potenciar as iniciativas da sociedade civil organizada: desde entidades culturais, educativas, empresariais, etc. Certamente tem-se colocado muita ênfase no aumento do turismo. Este coloca vantagens claras, uma vez que os visitantes do Estado espanhol não se concentram apenas no período estival –a diferença do que os de outros países– deslocando-se ao longo do ano e repartindo-se por todo o território, com presença significativa nas regiões do interior. No entanto, são precisas novas formas de intercâmbio que fomentem o conhecimento mútuo: acampamentos juvenis, intercâmbios escolares e universitários, etc.

Para finalizar este apartado, e embora tenham surgido diversas controvérsias no âmbito da gestão de recursos, o regulamento dos caudais dos rios Douro, Tejo e Guadiana continua a ser, apesar do acordo de 1998, um problema de primeira magnitude. Os três principais rios portugueses nascem em território espanhol (4 se contarmos o Minho), de onde provêm também, em grande medida, os principais problemas causados por desvios, trasvases e contaminação. Apesar do acordo de 1998, os problemas de água evidenciados nos últimos anos mantêm viva a tensão. A isto soma-se o problema energético, uma vez que no Douro se estão produzindo 2000 GWh menos ao ano pela redução de caudais nas barragens espanholas, obrigando à Rede Elétrica Nacional a comprar mais e mais energia das centrais termo-elétricas. Se a actual tendência continuar, em poucos anos a situação colocará ao sector eléctrico português em graves apuros (Balsemão, 2001:92-93; Folgado, 2001:72).

Joám Evans Pim, Director do Instituto Galego das Relações Internacionais e da Paz

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